16.10.06

uma carta: fragmentos (ou: a arte de fazer resumos)

(burlesco familiar)
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Leitura dinâmica de uma carta de quatro páginas em Arial 10:
Subtexto
Espero que você esteja olhando os seus e-mails. Lamento profundamente por tudo o que já falei ou fiz. Sei que você está muito ocupado - desde a última vez que conversamos. Eu jamais me meti sem que alguém houvesse pedido. Acho compreensível e bonito o seu gesto, mas sinto-me profundamente afrontada. Realmente, você não tem noção. Mesmo não devendo satisfações a ninguém. Ela em geral só me procura para pedir alguma coisa - além das suas ocupações atuais. O que não sei se você sabe é que sempre digo e repito que eu gostaria muito de almoçar com você, suponho que por falta ou de tempo, ou de vontade. Afinal, eu também poderia tomar essa iniciativa. Não se trata de queixas ou acusações, acredito que ela já tem maturidade mais que suficiente. Eu simplesmente não tenho sabido como resolver. Pelo menos, um diálogo do tipo que eu conheço e que, na verdade, lamento muito e [do] qual me arrependo. Só por isso ainda não tomei a iniciativa de procurá-la: me falta coragem. Não conheço outra alternativa e, sinceramente, isso me desespera. E, pior, nos dois casos ela está convencida. Eu não ligo. Queria muito descobrir uma maneira de passar por cima do seja lá o que for que eu esteja sentindo ou de quaisquer que sejam os meus motivos. Isso não passa pela sua cabeça nem por um instante sequer? Nada mais interessa? Vai indo tudo aparentemente muito bem porque eu me afasto, porque eu não a amo. Preciso às vezes manter uma certa distância com todo mundo. Ela fala muito do que ela precisa porque não há negociação possível. E, no entanto, eu hoje acredito. Simplesmente não sei o que fazer se eles forem de algum modo contrários, e eu que me dane. Não tem outro ou. Não consigo encontrar uma solução. Era poder conversar sobre isso. Só posso falar por mim. Será que o desejo dela é grande o suficiente? Será que o amor dela por mim? Ou será que não interessa? Eu tenho que fazer das tripas coração, e não uma boneca. NÃO É CAPAZ DE ME ENXERGAR? NÃO LEVA EM CONSIDERAÇÃO? Hoje, essa é a minha maior limitação: está além da minha capacidade descrever no sentido de superar isso. Apesar de todo o seu amor por mim. Hoje eu ainda tenho pavor, na expectativa de que eu "conserte" as "falhas". Sou EU a ÚNICA responsável. Ela continua não sendo capaz de cogitar que provavelmente está além da compreensão além de mim mesma. Absoluta incompreensão desta família. Como se eu não existisse, mesmo que "me enxergar" seja algo. Você não tem idéia do quanto isso é foda. Sabe do que mais? Se coloque no meu lugar e tente: como é que você ia QUERER se aproximar? Esse é um dilema que me assombra: o que quer que eu faça, ter que viver com esse peso. Sei que devo ter sido confusa; peço desculpas, mas muito obrigada por ter lido até o final e me telefonado hoje. Pela primeira vez consegui. Sou uma pessoa muito "dramática", beirando o farsesco. Lamento muito.
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Dadaísmo pouco é bobagem.

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