30.7.08

Às vezes me dou conta de que estou olhando pra trás há tanto tempo

Às vezes me dou conta de que estou olhando pra trás há tanto tempo que nem lembro quando foi que começou. Esperando alguma coisa que nunca veio, lamentando tudo o que foi, perdida num pântano gelado e fedorento, me arrastando, com a água ora nos joelhos, ora nas coxas, ora no pescoço, rodando, dando voltas sem perceber nem ir a lugar nenhum.

As partes do meu corpo dentro d’água é como se se diluíssem nela, e não as sinto. E o ar que respiro é úmido e denso e carregado de odores e miasmas, e inspirar é uma façanha penosa. (Outro dia vi na televisão um programa sobre a natureza de cada um. Pensei na sensação que me persegue há anos de estar imersa numa água fria, gelada, escura e concluí: sou de natureza molhada.)

É esse muco todo que me inunda, se acomoda na minha garganta e me vem do estômago porque penso demais. Quer dizer, eu sou fria e úmida por dentro, o meu muco é a lama do meu pântano musguento. O ar, uma neblina espessa que filtra a luz e cria uma claridade difusa e amarelada capaz de fazer qualquer um duvidar da própria existência do sol.

Sou filha da lama pegajosa, devoradora, movediça, e do céu baixo, do ar grosso, distante e imaterial (e ao mesmo tempo pregnante, ubíquo, invasivo; úmido, ele também). Então, durmo e sonho com o ar leve, fino e aberto; e com a terra, sólida, firme, concreta. No entanto, este lugar sem horizontes nem rumos nem caminhos é apenas excessivo, inconstante e estéril. Tudo é desolação aqui, e tudo o que faço é dormir.

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